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Você está perdendo dinheiro e nem percebe: A armadilha do custo afundado

A Falácia do Custo Afundado nas Finanças

Quando o passado te impede de seguir em frente: A história de Marcelo

Marcelo sempre sonhou em abrir o próprio restaurante. Em 2020, investiu todas as suas economias em um pequeno bistrô no centro da cidade. Aluguel caro, reformas inesperadas e uma pandemia global tornaram a operação um desafio constante. Mesmo diante de prejuízos sucessivos e queda drástica na clientela, Marcelo insistia em manter o restaurante aberto. Sempre que alguém sugeria que ele fechasse, ele dizia: “Já investi tanto dinheiro aqui… Não posso desistir agora!”.

O problema é que, ao insistir, Marcelo não apenas perdia ainda mais dinheiro, como também se desgastava emocionalmente. Sua decisão não era baseada no potencial futuro do restaurante, mas no dinheiro já gasto, dinheiro que, independentemente de suas ações, não voltaria mais. Marcelo, sem perceber, caiu em um erro clássico, a falácia do custo afundado

O que é a falácia do custo afundado?

A falácia do custo afundado (em inglês, sunk cost fallacy) é um viés cognitivo no qual pessoas continuam investindo tempo, dinheiro ou esforço em uma decisão improdutiva com base nos recursos já investidos, e não nas perspectivas futuras.

Em termos financeiros, isso significa manter investimentos ruins, negócios deficitários ou projetos inviáveis apenas para "não perder o que já foi gasto", mesmo que a escolha racional fosse abandonar a empreitada.

Segundo Arkes e Blumer (1985), que popularizaram o conceito em seu estudo seminal, as pessoas sentem uma aversão profunda a perdas (loss aversion) e, por isso, tendem a valorizar investimentos passados de maneira desproporcional ao seu valor real.

Exemplos comuns de falácia do custo afundado nas finanças:

  • Investir mais em uma ação em queda apenas porque já perdeu muito dinheiro nela, ao invés de avaliar racionalmente as perspectivas do ativo.
  • Manter um imóvel desvalorizado esperando que "um dia" volte ao preço pago, ignorando que poderia aplicar o dinheiro de maneira mais produtiva.
  • Continuar pagando cursos, mensalidades ou projetos que já demonstraram ser ineficazes, apenas porque já houve um gasto inicial.

Por que somos tão vulneráveis a esse erro?

A psicologia explica: além da aversão à perda, há o desejo de evitar o sentimento de arrependimento. Admitir que um investimento não deu certo ativa áreas do cérebro ligadas à dor (Breiter et al., 2001), fazendo com que muitas pessoas prefiram prolongar o sofrimento a reconhecer o erro.

Esse comportamento é amplamente estudado na Economia Comportamental, ramo inaugurado por estudiosos como Daniel Kahneman e Amos Tversky, que demonstraram como nossas decisões financeiras são frequentemente irracionais e moldadas por emoções.

Como evitar a falácia do custo afundado?

  • Foque no futuro, não no passado: Ao tomar uma decisão, pergunte-se: "Qual é a melhor escolha daqui para frente?" Ignore os investimentos já feitos, eles são irreversíveis.
  • Estabeleça critérios objetivos de corte: Antes de iniciar um projeto ou investimento, defina um limite de perdas ou um ponto de revisão crítica.
  • Aceite que erros fazem parte do processo: Reconhecer um erro cedo evita perdas maiores. Nas finanças, resiliência é admitir rapidamente o que não funciona.
  • Consulte terceiros imparciais: Um olhar externo (como um consultor financeiro ou um mentor) pode ajudar a tomar decisões mais racionais, livres da carga emocional.
  • Eduque-se sobre viéses cognitivos: Entender como sua mente funciona aumenta a capacidade de resistir a esses erros.

Considerações finais

A história de Marcelo é um lembrete poderoso: insistir em algo apenas porque já investimos nele pode levar a perdas ainda maiores. Em finanças assim como na vida, saber a hora de parar é tão importante quanto saber a hora de persistir.

Reconhecer a falácia do custo afundado não é desistir; é ser racional e proteger seu patrimônio.

Referências

  • Arkes, H. R., & Blumer, C. (1985). The psychology of sunk cost. Organizational Behavior and Human Decision Processes, 35(1), 124-140. https://doi.org/10.1016/0749-5978(85)90049-4
  • Kahneman, D. (2011). Thinking, Fast and Slow. Farrar, Straus and Giroux.
  • Breiter, H. C., Aharon, I., Kahneman, D., Dale, A., & Shizgal, P. (2001). Functional Imaging of Neural Responses to Expectancy and Experience of Monetary Gains and Losses. Neuron, 30(2), 619-639. https://doi.org/10.1016/S0896-6273(01)00303-8
  • Thaler, R. H. (1999). Mental Accounting Matters. Journal of Behavioral Decision Making, 12(3), 183-206. https://doi.org/10.1002/(SICI)1099-0771(199909)12:3<183::AID-BDM318>3.0.CO;2-F

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